domingo, 26 de abril de 2009


Estava esperando ônibus e passou por mim um senhor.
Calça preta, camisa de botão amarela. Normal, parecia até bem vestido.


Quando de repente ele pára na primeira lixeira e olha lá pra dentro. Pensei que talvez tivesse deixado cair algo, sei lá.

Mas não. Infelizmente não. Ele não deixou cair algo, ele buscava algo. Algo para comer.

Olhando pra dentro da lixeira, de repente deu um sorriso. Meteu o braço e tirou um copo, com um pouco de suco.


Mas quando o copo bateu na boca da lixeira, caiu no chão, entornando todo o conteúdo. Ele assumiu então uma expressão de profunda frustração. As lágrimas vieram aos olhos, dele e aos meus.

Mas eu não consigo reagir nessas horas em que a emoção me pega. Pensei em quantos copos de suco como aquele já joguei numa lixeira igual àquela. E quantas pessoas como aquela poderia saciar pelo menos um pouco de sua sede ou fome.

Será que esse senhor já tinha comido hoje? Será que vai comer amanhã? E quanto nós já jogamos fora hoje?

Vendo uma cena como essas eu me dou conta de que nunca na minha vida senti fome, fome mesmo, no sentido mais real da palavra. Aquilo que sentimos por ficar algumas horas sem comer, ou nem isso, às vezes só por ter vontade de comer algo em especial... aquilo nem se compara à fome!


Quando "acordei" da emoção, me vi com uma garrafa de água pela metade na mão. Não estava com tanta sede assim. Perto da sede dele, a minha não era nada.


E eu nem consegui reagir. Me odiei tanto por não perceber o que eu poderia ter feito, aliviado por alguns momentos a sede de alguém e, talvez mais importante, demonstrado a ele que ele não é invisível. Que eu assisti e me comovi com o sofrimento dele.

Mas eu não consegui. E hoje eu me odeio por isso. Quando foi que eu perdi a capacidade de me preocupar com o outro?

Isso me lembra um poema de Manuel Bandeira:
Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus,
era um homem.

2 comentários:

  1. As vezes a perplexidade é tanta que diante desses choques de realidade acabamos por ficar inertes...
    é até compreensível, mas não pode se tornar uma constante!
    O lance mesmo é fazer o que puder, sempre que puder à quem precisa! Isso serve pra cada um de nós!
    ...e a hora é agora!

    Fiquei com os olhos completamente marejados por ler o acontecido...

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  2. muito triste amor!!! jah vi um jovem em niterói fazendo o mesmo... mas no caso dele era diferente, pois sempre via com cigarro na mão... tb envolve outros problemas.

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Tem alguma coisa que vc queira me dizer?